quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Renúncia Pascal

Madrugada de Lisboa como as de Bruxelas. Do tempo em que viajava.
Insónias de quarto de hotel.
Estou cedo demais na paisagem.
Corta-se o fiambre e conta-se o pão nas pastelarias.
O primeiro café bebe-se como o primeiro beijo: de um sorvo.
A conversa fica por conta das máquinas que os homens ainda mal sussurram. Não vá o sol acordar antes da hora e pôr-nos em fuga.
Ainda cheira a banhos e a lixívia.
Cruzei-me com o sem-abrigo do L. Vuitton. Como há muito não. Um cobertor dos pés à cabeça: embrulho de morto e de sobrevivente.
Outro dia vi-o, homus erectus. Estranhei: um ser como outro qualquer, o sem-abrigo do Louis. Ultrapassa-se.
Haviam de estender-se pela avenida como um tapete mal esticado, mudar o sono para o turno de dia, fazer-nos tropeçar. Uma evidência calamitosa requer um valente rasteira.
Esta timidez, esta mudez, este recolher obrigatório alinhado pelos big ben das metrópoles rouba-lhes a visibilidade, a notícia. Só mesmo nos natais.

Que digo eu?
Que lhes exijo, se é nesse afundamento de alma que o tecto se perde?

Outro café e eu mudo de assunto. Já que não posso mudar de mundo.

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