Conselho de Pessoa
Deram-mo quando era ainda muito miúda. Li-o vezes sem fim. Suspeito que se entranhou em mim como serpente que engolisse por acaso, confundido o réptil por uma gruta quente e húmida a dizer-lhe que era sua. Era eu. Houve muitos outros importantes nas várias vias da minha vida. Nenhum tão estruturante como este. Assim o suspeito. Quem bem me conhece compreenderá. Quem não, terá certamente o prazer de reconhecer num mestre o que em si mesmo pressente como sendo.
Deixo-o aqui, por ser parte intrínseca de mim. Para continuar a tê-lo por perto. Para o partilhar com os que também lhe sentem a falta, com os que - a partir de hoje - a vão sentir. Dou-vos, de bom grado, este conselho.
CERCA DE GRANDES muros quem te sonhas.
Depois, onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Põe quantas flores são as mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não ponhas nada.
Onde ninguém
Faze canteiros como os que os outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim como lho vais mostrar.
Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.
Onde ningém
Faze de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém, que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és -
Um jardim ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu a vês.
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