segunda-feira, março 07, 2005

Aviso à navegação

Não acredites em nenhuma das palavras que te diga: trago a alma suportada por um corpo que lhe toma a voz de assalto e mente. Não acredites em nada, porque tudo o que é de ser o desejo suspende.
Tamanha é esta invenção de amar que as histórias sobre elas próprias se põem a imaginar, à minha frente.
E falta-me o gesso para dar ordem a este sentimento etéreo e burlesco.
E falta-me, sobre a pedra, o escopro e o martelo, para dar forma exacta a cada gesto, para não perdê-lo.
Não registes nenhum dos meus olhares: são intensidades só, são ludíbrios, são apenas ardilosas íris de enganar, fingidos arco-íris. Como cabelos coloridos de luas, luzes da noite fazendo-se passar por suas, por solares.
Não te acredites nem mesmo nestas fogosas frases que, ao dizerem que te minto, querem que julgues que só faço por esconder nelas o avesso do que sinto.
Não acredites em mim que sou sereia. Pede, por favor, a um amigo de Ulisses, verdadeiro, que te amarre ao mastro, que te vede os olhos, te retire por inteiro o desejo de sobre a superfície por onde se estende, maligno, o meu lastro, o meu rasto mortal, o som falso do meu peito.
Ouve-me esta última vez que depois de mim há-de vir só o capricho e o desgastá-lo. E voraz, imparável, o desejo de o amar só por amá-lo.

1 Comentários:

Blogger J disse...

Acreditar em ti, apenas como um modo de afirmar que à noite se segue o dia e depois a noite. Vã a forma utilitária como afirmas as vantagens de um desejo fresco e passageiro. Somos transitórios, fugazes, passageiros de nós mesmos. Não chegamos a lado algum, apenas as nossas obras falam por nós.

9:48 da manhã  

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