segunda-feira, dezembro 06, 2004

Minority Report


O domingo não é um dia, é uma véspera. Deve ser por Deus estar a descansar e ser inconveniente aborrecê-lo. Vem-nos tudo a despropósito de tudo. Como se tivessemos esquecido o guião e nos mandassem sentar, de castigo. Aos domingos não somos de ser, somos de assistir. À missa, ao futebol, ao cinema, à leitura dos jornais. Agora que é Inverno e não há como fugir para a suspensão morna dos areais.

O domingo não é um dia, é um intervalo onde a memória aproveita para atacar os infiéis, gente que fica por casa a tentar resolver mistérios. Como este de quando eramos crianças e uma de nós inventou um jogo inteligente e perverso: convencia-nos a deitarmo-nos de barriga a descoberto e sentava-se, de um salto, sobre nós. Tudo acontecia numa questão de segundos, mas a sensação ainda hoje a guardo como a mais conseguida composição de dor e de impotência. Depois, no salto inverso, voltava ao chão e perguntava, com a inocência provável de quem ainda não cresceu: "Foi um alívio, não foi?".

Não sei que carta se leu hoje (se a aos hebreus, se a aos coríntios); não sei se foi o teu clube que venceu ou se estás de ressaca; não sei se, finalmente, vais pedir namoro amanhã à miúda das pipocas. Mas sei que não troco por nenhumas outras estas horas mortas e a respectiva metáfora da felicidade.

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