Roubos d'Alma
Tenho no colo um sonho. Retirei-o da memória, no afã das grandes limpezas de mais uma estação que muda. Duas vezes por ano visto o meu colo deste mesmo sonho. E visto assim, deste colo que vai envelhecendo à sobrelotação dos dias, o sonho parece intacto, inofensivo, possível… Talvez seja por isso que, ano após ano, ele vai resistindo aos meus mais legítimos ímpetos de oniricídio. Deve ser por isso também – estranha alma a minha que só poupa o que consome – que ainda não consegui reclamar o seu lugar para nenhum outro.
Sonhos que começam quando ainda mal sabemos sonhá-los, é neles que se esculpem os homens invisíveis.
Sonhos que começam quando ainda mal sabemos sonhá-los, é neles que se esculpem os homens invisíveis.
Neles que se perdem, numa só, múltiplas vidas.
Maldito o sonho que o meu colo acalenta, mesmo depois de o ter atirado à vida vezes sem tino e de ter sabido que não é de vida que ele se sustenta!
Maldito o homem que lhe roubou a forma e que vai e volta e que tudo transtorna como se não fosse nada com ele!
Maldita a força que lhe dei!
Maldita eu que não me interditei!
Maldito o homem que lhe roubou a forma e que vai e volta e que tudo transtorna como se não fosse nada com ele!
Maldita a força que lhe dei!
Maldita eu que não me interditei!
1 Comentários:
Noutros dias, noutras andaças, a propósito de outras conversas, falávamos nós de amores, nascidos, criados, fúteis, inúteis, apreciados, acalentados... Enfim, de misero folhetim de final de século XIX, escrito em rasca papel de embrulho, cinzento, pardo como a alma de tão tristes amantes, que vivem a vida deles, que é, no final de todas as estórias, a nossa.
Romance de cordel, assim se chama por ter tido uma misera encadernação a resguardar uma não menos mísera paginação parda de papel besuntado de paixões, e no final disto tudo a segurar tão trágico volume temos um reles cordel, daqueles que servem para segurar o embrulho da mercearia de outros tempos, de outro país, que é a nossa vida! Ridiculo cordel que me seguras a mim por um fio, e a tantos outros em tantos outros fios entrelaçados como cordões umbilicais, velhos, que nos prendem a outras vidas, a outras mães!
Pobres de nós, Édipos sem sentido do ridículo!
Onde estão os ganchos de cabelo, para também eu poder furar os meus olhos, esvaziando-os de toda a alma que as paixões corromperam?
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