terça-feira, setembro 20, 2005

O Sentido da Sombra


Ainda bem que não vieste visitar-me este verão.

Ainda bem que não apanhaste o Sud, que te deixaste ficar a enlouquecer pelo calor das praças imperiais, que te deixaste levar pelo namoro das águas d'azulejos dos mil fontanários de Paris.
Longe agora dos meus mares magníficos, já posso dizer-te o quanto te invejei por não estares aqui. Porque este não foi um verão, minha irmã, foi um inferno. Explicar-to seria revivê-lo e disso era eu capaz de morrer e tu não quererias e eu também não seria capaz que a vida tem destas obrigações de termos de a cumprir, de passar às estações, malgré tout, que as há seguintes.
E agora que as crianças vão regressando ao folhear dos dias e que nós sabemos que a folhagem se perderá assim que se perca o sentido da sombra, não sei se deva temer o rigor que se aproxima... se contentar-me por poder passar o testemunho das lágrimas às chuvas.

Lembrar-te-às de une petite lettre que te enviei já faz uns quinze anos. São ciclos, ma petite, ciclos. Vaut mieux que tu la déchire. Maintenant, ça vaut plus rien.

Vá lá, não chores. Sobretudo isso. Porque afinal a vida é tal e qual um vestido: um dia essencial; outro dia excessivo. Por favor, não chores! Vou precisar muito de ti. Outra vez.

Em sendo Outono, apanha o Sud. Traz-me um sabonete de rosas, um saquinho de alfazema e escrito por ti, que me obrigue a sonhar, traz-me um poema. Temos as duas um menino para amar. Ou, plus exactement, para ensinar que vale a pena.