sábado, fevereiro 19, 2005

Glosa à Utopia

Ser eterno o amor é amá-lo
num nunca ver morto o mistério,
num sempre mudá-lo.
É em cada segredo d'alvorada ser razão de ser o descobri-lo.
É haver no caminho do olhar a mais larga estrada
e desvairada, qualquer que seja,

toda e qualquer palavra
(que ouse explicá-lo).
É ser não mais que um som de corpo que estremece
na ideia de ser só
o corpo que o espera.
E é o som do suspiro quando o é.
É ser depois o eco que o reverbera.
Tão fundo
tão forte
tão imperecível
como uma morte
etérea.
É ser o corpo que o distorce até
que os olhos se revejam e se reajuste o mundo
como se tivesse só havido Agora
e nem um beijo.

Ser eterno o amor é ressuscitá-lo
sem a mais leve memória
de ter chegado a amá-lo.

quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Shame on me!




Foi só o bulício, o atrapalhado do dia a fazer das suas.
Quando dou por mim é o dia seguinte e tu dormes.
Parece mentira e, no entanto, não: acordo com o que vivi em formato de recordação.
Ontem são estes primeiros minutos de hoje, antes de ser vez de ser correria outra vez.
E todavia não esqueci nenhum pormenor de que me não lembrei.
Bendita lucidez desajustada do tempo, petit-déjeuner para antes do deserto, beijo de força anterior à guerra!
Tenho ideia da casa composta e das tuas mãos; do repasto original; do esforço para não zangares a voz contra os meus caprichos de mulher afogueada de tão despudoradamente gostar de si.
Que vergonha este sonambulismo de amor!
E sigo em frente, até ser velha e a torpelia das formas me fazer aterrar as asas sobre ti.
Obrigada, my valentine, pelos dias de voo que me dás!

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