terça-feira, julho 15, 2008

Shhhhh....


Suspenda-se esta rotina malsã!
Instalem-se condições excepcionais esta manhã!
Que os autocarros não circulem e o metro páre e
não se veja motivo de avaria, nem se faça alarde!
Que ao longo das avenidas nada se mova e que
ninguém questione ou se comova!
Que não se tussa!
Que não se murmure!
Que mal se respire!
Que o olhar não cruze outro olhar à procura de cúmplice ou de par!
Suspendam-se todas as conversas, as virtuais e as outras!
Fechem-se os canais e as comportas!
Instale-se um silêncio de excepção, sem ordem expressa para tal, sem pré-aviso e sem convulsão!
Como se num acordo profundo, cansados de sermos sempre iguais, tivessemos combinado tirar o som ao mundo.

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segunda-feira, julho 14, 2008

Blowing in the wind

Eu bem te disse que ao entrar fechasses bem a porta para não deixares passar o vento.
O vento é capaz de pôr em causa a mais perfeita das harmonias e, ainda assim, passar incólume.

Não o vento robusto de que se compõem rajadas e que uiva e que ulula para que saibam que, apesar de invisível, ele está ali e quer ver reconhecida a autoria dos estragos.

Não esse vento-homem, mas aquela aragem fina, ainda imperfeita mas já pujante, ferida de pequenas brechas e em uma lamúria constante...um sopro insinuante e desordeiro que vai almofadando os nossos passos até que, de súbito, no momento certo, nos causa - impávido - o maior dos embaraços.

domingo, julho 13, 2008

Na Solidão de um Ateu

Um velho amigo meu dizia-me que procurarmos um sentido na vida era prova da maior arrogância.
E grande covardia essa ideia de um Deus que acautelasse o nosso futuro, assim nós cumprissemos os seus preceitos e fizessemos o mea culpa por cada dos nossos desvios.
Sentido e Deus, Arrogância e Terror são hoje uma dupla tão lógica quanto incómoda em cada um dos meus dias.
Invejo, não sem desprezo, aqueles que vivem na leveza da Fé e no consolo do Determinismo.
E, no entanto, já não seria capaz de conviver em harmonia com a minha dignidade se não me confrontasse, diariamente, com esta finitude de que sou feita, com este sem propósito com que me afirmo, convictamente, em cada uma das minhas decisões.
Por isso, quantas vezes, me vejo a vacilar entre o Bem e o Mal, não havendo castigo marcado, nem paraíso à vista e sendo o perfil da Sombra tantas vezes tão próximo dos nossos mais secretos Sonhos...não digo a sombra funesta com que, avançando, mortificamos os outros; falo desse Lado Obscuro que apenas tem, por contraditório, a Moral Social, a identificação com um Colectivo correcto e civilizado.
O Bem, a Luz, escolhidos, assim, na Solidão de um Ateu, são muito menos convidativos e, seguramente, muito menos consoladores.
Por isso é que cada uma das minhas boas acções não me faz necessariamente mais Feliz, mas torna-me, a cada dia, mais Forte na convicção de que ninguém decide por mim. E esta é, afinal, a minha Arrogância.